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quarta-feira, 7 de março de 2012

Escute o silêncio, Teresa

Não recordo a última vez que elogiei Teresa. Sei que esta manhã, quando ela pegou a bicicleta que estava atirada em um canto da lavanderia e foi pedalar, fiquei na vontade. Não usava nada que realçasse suas formas. Pelo contrário. Vestia qualquer coisa velha e comportada. Mas tinha os habituais olhos marotos e aquele sorriso de uma só linha, que não deixa mostrar os dentes. Estava linda. E indubitavelmente sexy.

Quando fomos apresentadas, disse a ela que era a mulher mais bonita que eu já conhecera. Ela respondeu que aquilo não era novidade para seus ouvidos. Viesse da boca de outra pessoa isso soaria prepotência. Talvez até tenha um pouco disto. Mas Teresa apenas me alertava que eu teria de ser mais original em minha conquista. Sabia desde o início que não era verdade absoluta o que eu dizia. Que há muitas outras mulheres mais belas que ela. Mas tinha, e ainda tem, plena noção dos desejos que desperta. O caso é que, com verdades ou mentiras, conquistei-a.

Aquela mulher hoje é minha. Eu, de início, quis mostrar isso ao mundo. Saía por aí de mãos dadas com ela. Orgulhosa. Quando alguém elogiava sua beleza, eu me fazia de rogada, e como fosse a coisa mais natural do mundo, apenas sorria e balançava a cabeça. Sem alardes. Teresa, danada, percebia meu jogo e participava. Toda vez que íamos a um evento com a presença de conhecidos meus, aprumava-se na medida exata de causar boa impressão, sem exageros.

Teresa tem um quê de narcisista. Porém, não a ponto de afogar-se em suas próprias águas. Às vezes ela tira minha roupa, me põe em frente ao espelho, e alisa meu corpo, sussurrando em meus ouvidos ora safadezas, ora delicadezas.

- Percebe, Lúcia, quão bonita és?

Com o seu corpo colado ao meu, Teresa, percebo. Nada digo. Mas penso que tu ainda és aquela mulher bonita e sexy que um dia caiu no meu papo furado. É que ouvi de tua própria boca que tantos outros já falaram – e de certo continuam a falar, mesmo que tu não me contes –, que prefiro ser tua eterna admiradora. Como nesta manhã, quando foste pedalar por aí. Escute meu silêncio, Teresa. É o que de mais verdadeiro te digo.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O (des)arrumar dos lençóis

Deito-me do lado direito da cama. Ele, no esquerdo. No início dividíamos a tarefa de arrumar os lençóis. Com o passar do tempo, passei a fazer isso sozinho. Não por falta de vontade dele. Mas por hábito meu, que deito e acordo antes. Sou eu quem faço o convite quando o sono chega. Antes confiro o relógio da tv, mudando os canais e torcendo para que nenhum programa o desperte. Então faço o convite. Ele pergunta que horas são. Confere por si mesmo, e se espanta como o tempo passou. Solta um suspiro de resignação.

Eu, que já escovei os dentes e lavei o rosto, sigo direto para o quarto. Já ele cumpre todo um ritual. Costuma ir primeiro à cozinha buscar seu copo de água, que fica ao lado da cama e por vezes faz companhia aos copos e xícaras de noites anteriores. Eu cuido para que as luzes do quarto estejam acesas. Apago assim que ele vai ao banheiro. Ocupo o espaço da cama que me cabe, aquele em que as cobertas não estão presas ao colchão – o dele é o outro, que mais parece um casulo. Impacientemente aguardo por ele, ao som da torneira aberta.

Assim que a água deixa de cair e as portas rangem, me aprumo. Ele caminha pelo vão estreito entre a cama e a parede. Senta na beirada. Toma sua água. Solta mais um suspiro. Ajusta o despertador. Confere se as cobertas estão presas do modo que gosta, e, finalmente, se deita. Eu não durmo sem uma troca de “boa-noite” e um beijo. Ele sabe disto, mas às vezes, algumas de propósito, outras de pura distração, talvez, simplesmente fecha os olhos. Zangado, dou-lhe as costas. Ele nem percebe, ou finge não perceber. Viro daqui e dali. Até que desisto e faço o que esperava que ele fizesse. Ele me abraça. Eu sorrio.  Está tudo bem. Pomo-nos a dormir.

Alguns escritores, como americano Herman Melville, autor de Moby Dick, afirmam que não há lugar melhor que a cama para confidências. “Há casais que conversam sobre os tempos passados até que os surpreende o amanhã.” As nossas são feitas em silêncio, com o roçar de pernas e o alisar dos braços. E por vezes ocupamos a cama toda, sem lados direito ou esquerdo. E desarrumamos os lençóis. Juntos.

sábado, 15 de janeiro de 2011

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Essa não é uma carta de despedida

Pensei em não escrever uma carta para vocês. Assim, talvez, minha partida não seria vista como despedida, mas sim como um 'até logo'. Só que, por mais clichê que isso possa parecer, na vida páginas não podem ficar em branco. Essas folhas nas quais minhas palavras estão sendo escritas são de um bloco que ganhei de presente. Até poucos minutos, ele estava intacto. Agora não mais. Rasguei-o. Ele não está mais completo. Mas essa incompletude é justamente a finalidade dele. O bloco agrupa folhas, que sabem que seu destino é o encontro de um escritor; ao serem destacadas, mesmo que por algum momento sintam-se sozinhas, perdidas, elas ajudam a escrever uma história. Eu, assim como vocês, sou uma folha. Quero histórias de um lugar mais distante. Por isso deixo o bloco que tanto amo. Aqui, vocês continuarão a escrever juntos. E eu acompanharei, mesmo que de longe, cada escrita. Minha incompletude terá fim a cada vez que nos agruparmos novamente. Boas histórias, 'minhas folhinhas'. Essa não é uma carta de despedida. É de encontro!

Estrela, 14 de dezembro de 2010

Andi

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

x, y e as reticências

Ipsilone: Reticências fazem diferença?
Xis: Não! Mas deixam suspense, não?
Ipsilone: Suspense é o meu segundo gênero preferido...
...Xis: Drama em primeiro?
Ipsilone: Tão previsível assim?
Xis: Afinidades...

domingo, 26 de setembro de 2010

"Você vai gostar"

O cenário era um bar da cidade. A história não é nova. É de meses atrás. Eu era um dos personagens. A protagonista era ela, a cantora. Depois da primeira vez que lá estive, voltei outras duas, uma atrás da outra. O motivo foi um só: a música cujo refrão não saía da minha cabeça. "Tô bem certo de que você vai gostar, você vai gostar..." Ela cantava o trecho com um sorriso malicioso e fixando o olhar no meu . Parado ali, em posição contemplativa, eu correspondia à saudação. Não havia, de fato, nenhum interesse um no outro. Era pura encenação do romantismo e do saudosismo que a canção desperta; que me tomam agora e me fazem sentir vontade de voltar ao bar e novamente cantar: "Tô bem certo de que você vai gostar, você vai gostar..."